segunda-feira, 23 de maio de 2011

Crónica - S de Saudade, S de Solidão


Há cerca de um mês atrás, fui visitar a minha bisavó ao lar, onde se encontra perfeitamente instalada e com visitas regulares dos familiares. Passado um ano, olhei de novo aqueles enormes olhos azuis que me invadiram o peito de uma nostalgia tremenda. Não sei indicar ao certo se foram as saudades, se foi a forma como as suas mãos envelhecidas me tocaram o rosto, aqueles olhos carregados de memórias olharam- me como se eu fosse um tesouro.
Estava bem para quem se encontrava com oitenta e tal anos, conseguia sorrir, lembrava-se dos nossos nomes e caras e nutria um sentimento forte por nós, e naquele momento era só isso que necessitávamos sentir.
Olhei em redor e um sentimento de tristeza invadiu-me subitamente.
Os lares não eram sítios que me deixassem propriamente à vontade, era demasiada realidade para uma hora só, era tudo aquilo que a maioria das pessoas tenta ignorar e fingir que não existe, mas os idosos estão lá, na mais pura prova de que os anos deixam marcas e, por vezes, marcas irremediáveis, capazes de levar tudo, até ao mais ínfimo pormenor, e arrancar sem dó o que nos fora prometido.
Perdida nos mais sórdidos e inevitáveis pensamentos a que a situação obrigava, alguém me toca no braço e avisto uma senhora sentada numa cadeira, com alguma dificuldade em falar mas que consegue dizer-me baixinho: “Podes dizer à minha filha que me venha visitar?”.
O meu coração despedaçou-se, o meu corpo vacilou por momentos, as lágrimas escorreram-me pelo rosto e consegui, com alguma dificuldade, suspirar: “ Eu digo-lhe.”
Toquei-lhe na mão, ela abraçou-me.
À saída, olhei uma última vez para a senhora triste, que agora se encontrava com um olhar ausente, distante. Desejei que a filha fosse vê-la naquele mesmo dia, desejei que a solidão não fosse um sentimento e, por fim, desejei que a solidão fosse escolha do ser humano… mas aquela senhora não pediu para estar sozinha no mundo!

Margarida Barrozinho, 10.ºB

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