quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Variações sobre o retrato de Dorian Gray


Olhava-me ao espelho. O meu corpo mudara drasticamente nos últimos vinte anos. Não só o meu corpo, mas também as expressões da minha face. O que antes era alegre, jovem e feliz, transformara-se completamente e tornara-se triste, velho e deprimido. Completamente deprimidos tinham sido estes últimos vinte anos. Toda a minha jovialidade tinha murchado como as pétalas de uma rosa que o tempo secara. Tinham sido dias tristes.
Olhava o quadro, o quadro de família, aquele retrato de família alegre, que com o passar do tempo se tornara cada vez mais sombrio. Este quadro suscitava-me memórias e sentimentos que eu desistira de explorar.
Hoje, sozinha, olhava em redor para a sala que me vira nos meus dias mais felizes. Esta sala tenebrosa consumira-me a alegria. Já não conseguia sorrir, expressar uma palavra. Vinte anos de silêncio e solidão consumiam-me por dentro.
Olhei novamente o quadro. "Se ao menos pudesse viver sempre neste momento", pensei. "Se eu pudesse ser sempre jovem. Se o quadro envelhecesse!... Por isso, por esse milagre eu daria tudo. Gostava de poder trocar a realidade do quadro com a realidade actual. Que vivesse para sempre como no quadro, e que apenas a realidade actual envelhecesse, presa naquela moldura".
Olhei em redor, dei um último suspiro e sorri. Pensei no que mais queria que acontecesse. No meu desejo mais profundo. Com a faca que tinha no colo, a minha companheira de vinte anos. Coloquei um fim à minha solidão, e corri ao abraço da família que me esperava.
Ana Saltão, 11.º B

Hoje, sentada nesta cadeira de baloiço, no meio do alpendre, olho o lindo jardim, cheio de tulipas, rosas, malmequeres e margaridas, num belo dia de Primavera. Nunca conseguiria escolher uma visão melhor para os meus últimos dias!
Estive hospitalizada no início deste mês, com uma doença terminal, e decidi pedir aos médicos para me darem alta e me deixarem passar os últimos dias aqui, na minha casa de infância.
Agora olho para as flores e lembro-me de quando costumava apanhá-las para as dar à minha mãe, ao meu pai, aos meus avós... A quem as aceitasse. É a altura da vida em que todos merecem dizer: "Sou feliz!"
Virei a cara, deixei o meu olhar atravessar a porta aberta e fixar-se num dos cantos da sala. Aquela divisão estava cheia de quadros e fotografias de todos os membros da família, mas apenas um dos quadros me chamava mesmo a atenção. Um quadro meu e dos meus irmãos a brincar no jardim. Quem me dera voltar atrás no tempo, voltar àquele momento de brincadeiras de felicidade...
Mas nada dura para sempre e agora o meu tempo está a acabar... "Se eu pudesse ser sempre jovem, se o quadro envelhecesse!... Por isso, por esses milagre eu daria tudo!"
Sara Costa, 11.º B

Passaram anos e anos. Todos eles se tinham separado mas sempre guardaram recordações de tempos passados.
Foi sempre um pouco distante de todos os outros, andava sozinho e não conversava com ninguém. Chegaram a chamar-lhe esquisito mas nunca se importou com o que pensavam e diziam dele. Encontrava-se sempre de lápis e papel na mão, sentado nas escadas a desenhar aquela rapariga, aquela perdição, a sua razão de viver... Observava-a com a maior das atenções, desenhava todos os seus traços ao mais pequeno pormenor. Olhava-a por cima dos seus óculos grossos, com aqueles olhos azuis enormes. Não tinha tido a coragem de iniciar conversa com ela. Sempre que a via as suas mãos e as suas pernas tremiam, os seus olhos brilhavam.
Chegara o dia em que finalmente tinha tomado coragem para o fazer. Desceu as escadas, por instantes parou... Observou-a... Riu-se e partiu em direcção a ela. A vergonha era muita, as palavras não saíam, as suas mãos suavam descontroladamente. Por fim, uma força interna fê-lo falar. Cumprimentou-a, por entre pausas, perguntou-lhe se podia desenhá-la. Ela sorriu, e num tom carinhoso disse-lhe que sim. Ele pediu-lhe que sorrisse e se mantivesse assim por alguns instantes.
No fim, ela pediu-lhe para ver o seu trabalho. Observou-o com imensa atenção, depois hesitou algum tempo e, com um brilho intenso no olhar, disse-lhe: "Se eu pudesse ser sempre jovem. Se o quadro envelhecesse." Ele olhou-a com um olhar terno, agarrou-lhe na mão com a maior das delicadezas e respondeu-lhe: "A tua beleza permanecerá intocável com o passar do tempo." Ela fintou-lhe o olhar e num impulso deu-lhe um beijo na cara. Agradeceu-lhe o elogio, pegou nos seus pertences e abalou.
O rapaz permaneceu imóvel. Os seus grandes olhos azuis brilhavam, e sem que o conseguisse controlar, caiu-lhe uma lágrima...
Estava agora sentado na sua cadeira de baloiço à porta de sua casa. Tinha consigo um álbum de fotografias. Relembrava tempos passados e a sua mão permanecia sobre a fotografia de uma bela jovem. Os seus olhos encheram-se de lágrimas e por entre soluços afirmou: "Por isso, por esse milagre eu daria tudo..."
Cláudia Marques, 11.º A

Sem comentários: