segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Vestidinho vermelho

Ele bebia, bebia muito todos os dias e todo o dia. Já não sabia porque estava a beber. Às vezes, quando estava lúcido e conseguia fazer um discurso com sentido, nestes breves e ocasionais momentos, contava a sua história. Eu ouvia-a tantas vezes! Era sempre o mesmo: sentava-se na única mesa vermelha, na esquina, onde a luz não chega, apoiava a cabeça à parede e com as lágrimas a descer dos olhos contava como perdera o seu trabalho, a mulher, a vida... Pois é, aquela não era vida para ninguém!
Trabalhava como empregado numa agência de viagens, e gostava mesmo daquele trabalho! Gostava de ver as pessoas sonhar com paisagens maravilhosas, o relaxe e o divertimento que ele estava a oferecer. Mas com a crise económica ninguém queria viajar e a agência teve que fechar. E, como perdeu o trabalho, perdeu a mulher. Ela acabou por fugir com um rapaz dez anos mais novo e já muito rico para uma ilha tropical. Clássico!
Nunca teve filhos e de um dia para o outro ficou a viver sozinho, numa casa de que não gostava (nunca gostou daquela casa, mas a mulher adorava-a e o que não se faz por amor?), sem saber cozinhar e sem dinheiro.
E foi naquela altura que se tornou o meu melhor cliente! Vivia com o subsídio de desemprego que gastava inteiramente no meu bar em álcool e às vezes em comida. Viveu assim por quase cinco anos, até há alguns meses. Estava na mesa vermelha a contar a sua vida e entrou uma menina: era linda, parecia um anjo! Loura, com dois grandes olhos azuis, o sorriso dulcíssimo e um vestidinho vermelho com bolinhas brancas. Entrou no bar, pediu-me um sumo de laranja e uma fatia de bolo de chocolate, pagou e depois sentou-se ao lado dele. O homem ficou assustado e surpreendido. Ela olhou para ele, fez um sorriso enorme e disse: "Adoro o vermelho!"
Aconteceu assim, aquela menina chegou e mudou a vida dele. A cena repetiu-se também no dia seguinte e durante toda a semana. A menina do vestido vermelho voltava todos os dias e roubou-me o meu cliente favorito! Agora ele chegava, feliz, pedia dois sumos de laranja e duas fatias de bolo, sentava-se na mesma mesa, à espera dela, e conversavam!
O dia antes de morrer de um cancro no fígado, ligou-me e, muito devagar, pediu-me para tomar conta do seu anjo, porque a vida dele já estava a acabar. Não tinha medo, pelo contrário, estava curioso de saber se todos os anjos eram tão lindos e queridos como o seu!
Zaira Pellin, 11.º A

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