domingo, 18 de janeiro de 2009

O Direito de Reler



Adormecera a lê-lo. Outra vez. Começava a tornar-se um ritual nocturno – ler as mesmas palavras repetidamente, ininterruptamente, noite dentro, até que o olhos se fechassem e lhe proibissem o caminho para o éden escondido entre as linhas manuscritas. O poema entre as mãos era inalcançável, cada verso requintadamente mais inatingível entre a musicalidade que brotava de cada palavra. Reler. Sentir cada linha, novamente. A excelência daquelas palavras provava-se aí mesmo – inumeráveis leituras não lhes roubariam o encanto. Os sentimentos podiam ser revividos, a paixão reinventada, a ânsia da descoberta repisada entre infinitas declamações. Reler. Pregava-se à mente o direito de ressuscitar cada momento imaginado, relembrar cada pontada de dor e fazer renascer os sorrisos já esperados, recordar o que o espírito desesperava sofregamente por ler só mais uma vez. Reler. A derradeira oportunidade para renovar as sensações e prendê-las aos recantos de uma memória que cedo exigiria nova leitura. Reler. As palavras já decoradas só se sentiam e sofriam e alegravam e choravam no branco do papel. Cada palavra sentida como na primeira vez em que a mente lhe alcançou o significado. Porque a beleza das palavras resguarda-se num mundo inalcançável e, como são indestrutíveis, podem ser sentidas indefinidamente. Relidas eternamente. Reler.


Helena Couto, 11ºA

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