domingo, 3 de maio de 2009

AMADA ETERNIDADE


Poema criado pela aluna HELENA COUTO, no âmbito do Concurso Inês de CASTRO, dinamizado pelo Plano Nacional de Leitura e pela Fundação Inês de Castro.

Este poema pertence à página vencedora na categoria do ensino secundário.


AMADA ETERNIDADE


A história que agora conto
supera anos de lendas,
décadas de enredos de amores roubados,
séculos de lembranças de encontros encantados,
milénios de juras, de flores entregues
em vez das palavras imperfeitas
que não expressam tamanho sentimento,
de felicidade enfeitiçada
nas eternas memórias de enamoramento.


Não fossem as palavras dos antigos,
esta história teria sucumbido havia muito,
tal a grandiosidade da paixão, tão impossível,
não tivesse sido este um amor
superior a uma concepção compreensível.

Bebam-me as palavras,
imaginem os risos,
suspirem os encantos,
componham cada cena tortuosa
de grandiosidade tremente,
cada segundo amado, entre tantos,
e não será suficiente.
Logo verão,
admirarão,
algo que a razão vez alguma supõe,
que o entendimento não alcança.


1339, já mulher do infante português
a dama de Castela chamada Constança,
nascida entre o ouro da fidalguia,
joga-se o destino à tentação
e, superior aos fascínios da beleza,
a aia galega que lhe servia
arrebata o herdeiro do trono da pátria portuguesa.

Impuseram-se, arrogantes,
os rumores desconfortáveis entre
os sons do julgamento,
escondido em cada troca de olhares,
nos vestígios do desejo indecente.
As chamas do constrangimento
da superioridade moral inexistente
foram por demais incapazes de
de derrubar o que o acaso juntou
até aos limites da imortalidade.
A D. Afonso IV cabia a reprovação,
como Pai e chefe da nação,
que assim condenou o filho Pedro
pela libidinosa imoralidade.
A urgência entrosou-se no aparato,
que as imperiosas cortesias políticas
deviam ser preservadas, pelo bem da diplomacia.
As vozes da riqueza ditaram-lhes o fim imediato;
em Castela crescia a impaciência da fidalguia
e as vozes severas do Paço
cresciam tementes da revolução nunca feita,
pois se Pedro convivia com os Castro,
estava o perigo distintamente à espreita.


Inês provaria porém a razão
do soberano, a fúria da corte
e a legitimidade de tamanha provocação,
pois nem Albuquerque extinguiu
menor resquício da chama impetuosa
que o exílio de 44 tentou apagar.
Disfarçaram a saudade fervorosa
Entre as cartas e os bilhetes
e os encontros furtivos;
mas tais ínfimos instantes para amar
cedo desapareceram a par da tristeza.
No Outono que se seguiu,
morrendo a infanta portuguesa,
ficou o filho Fernando para criar
e Inês livre para adorar.
Viúvo, o infante mandou vir a amada
e assim viveram a vida dos sonhos,
juntos, ignorando a vergonha
e desagrado de uma corte escandalizada.


O desgosto d’El-Rei superava qualquer indignação
e o intento de emendar um amor renegado
instalou a discórdia entre pai e filho.
Dama alguma. riqueza alguma
substituiria o objecto de um amor desmesurado,
e prontamente o apaixonado
alegou dor e sofrimento pela mulher falecida.
A vida dos amantes
logo se traduziu numa vida a três,
a quatro, de seguida.
O pesar pelo filho finado
não contrariou a exultação
de Pedro por três outros filhos de Inês,
enquanto a agitação demente
da corte desassossegada
combatia zelosamente a felicidade
de uma relação que por certo
devia ser terminada.


O norte do país serviu-lhes os propósitos
durante os ditosos primeiros anos,
até que o Paço de Santa Clara
se revelou ideal à convivência enamorada.
Coimbra levava nos ventos
rastos de ventura brilhante
incessantemente maculada,
porquanto a prosápia frustrada dos receosos
se fazia ouvir cada vez mais. Demais.
Atordoados, um pretenso casamento
implicaria grave desordem
e, sucumbindo às mil preces,
viu-se que o régio tormento
acabaria com morte presta.
Encomendada a tarefa assassina,
e caçando o infante na floresta,
lançaram-se a cumprir a missão
três submissos executores;
1355, a dama galega apunhalada
na Fonte dos Amores
deixou que a vida extinta
cravasse na rocha lembrança imortalizada,
o derradeiro suspiro
perpetuamente inscrito em sangue
nas águas de uma quinta profanada.

Coimbra enublou-se pela mágoa do amado,
a fúria consumiu-o
entre as lágrimas negras do desgosto alucinado
e a demência da condenação
tomou-lhe, impetuosa, o ânimo magoado.
O sangue derramado seria vingado
mas nem mesmo a morte
condenaria em justiça tamanha crueldade.
Uma paz selada com o pai,
meses após austera separação,
não impediu a vingança, sua plena necessidade.
Perseguidos dois dos carrascos da paixão,
e posto que lhes fosse arrancado,
pelas costas e pelo peito,
o coração desapiedado,
assistiu Pedro,
já Rei, mas sem rainha,
à execução desejada,
enquanto se banqueteava
consolando a morte daquela
que a paraíso, afortunado, tinha.
Num instante de miserável compaixão,
o último celerado,
antes fugido com pavor da retaliação,
acabaria por ser etereamente perdoado.


Não se vingou o Rei
sem antes refazer o divino passado
que deveria ter existido,
sem antes garantir à bela amada
o que lhe era inteiramente devido.
Convocando toda a corte,
impôs o enlace que lhe fora roubado
e nem mesmo a morte o detinha
para, beijando a fria mão,
honrar quem depois de morta foi rainha.
No ano de 67, Alcobaça experimentou enfim
o auge da felicidade desfeita.
Aos amantes esperava-lhes
nas grandes alturas o êxtase perene
de uma imortalidade perfeita.


Juntos na perpetuidade do além-mundo,
jazem no mosteiro frente a frente,
para que se amem e se adorem
no esplendor do eternamente.


Analisando o que passou,
a sorte ilumina-me o rosto,
porque vi e vivi,
sei do desgosto,
sei do que foi d’O Amor da história
da nação lusitana, e da glória,
e da paixão desmedida que ficará
nas palavras, nos ouvidos,
nas lendas,
da pátria que se fez
da esperança do que se provou inabalável,
os laços imortais de Pedro e Inês.

Helena Couto, 11ºA


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